28/05/2014

A Arte do Apenas Passar


Enquanto lê, ouça “What Could Have Been Love - Aerosmith” 


A rotina nos leva a caminhar sempre com os mesmos passos, nos mesmos lugares, nos mesmos horários e muitas vezes nem percebemos como estamos presos em uma sistema automático de ordem e funcionalidades questionáveis. Acostumados com o padrão, seguindo a mesma linha, deixamos o diferente de lado e agarrando apenas ao conhecido, o confortável, o que acreditamos ser controlável, esquecendo de olhar para os lados.

Andando na mesma direção todos os dias encontro pessoas que em seus próprios trajetos interseccionam-se e por complacência não trocamos gracejos, apenas passamos direto, fingindo mal olhar. Mesmo esse momento meramente insignificante tem um efeito considerável ao nosso interior. Não que o cruzamento fosse essencial, mas sua rotina e continuidade é tamanha que um dia sem a presença daquele estranho passando no mesmo horário no mesmo lugar poderia levar a autorreflexões e preocupações sobre seu bem-estar; Apenas uma mudança simples e tudo parece surreal novamente.

Hoje estava caminhando, normalmente, olhando para o céu como sempre gostei de fazer, fico vendo os formatos das nuvens; o céu azul ajuda a me fazer bem, isso é algo que não conto para ninguém, as pessoas nunca entendem essas coisas e sempre fazem brincadeiras desnecessárias. Enquanto caminhava vi uma pessoa que não via a muito tempo, não conseguia lembrar seu nome, estava distante, encostada na parede, com uma expressão muito triste o que me fez ficar com uma vontade enorme de ir próximo e perguntar se estava tudo bem. aproximei quase que por obrigação, precisava passar por ali para continuar meu trajeto, a cada passo que aproximava meu coração apertava um pouco mais e quando cheguei ao seu lado ele olhou nos meus olhos. Sei que também me reconheceu, sentir meu peito apertar com sua expressão, meu corpo parecia mover em sua direção e não conseguia pensar em mais nada.

Passei direto, cada pedaço de mim queria fazer algo, mas continuei caminhando, nem olhei para trás e mais uma vez sentir como sou medrosa, como não pude ajudar a ele, mesmo sendo um estranho. Por sua expressão rígida e sofrida poderia ser que até um bom dia pudesse colocar um sorriso em seu lábios vermelhos e pequenos e seus olhos castanhos trémulos pudessem encontrar a paz e talvez até derramar as lágrimas que tanto segurava, estas passariam por seu rosto rosado e o deixaria umedecido, depois por sua barba feita a três dias atrás e então acertaria o chão. E nesse momento ele poderia olhar para mim que sou uma estranha e dizer, obrigado. Poderíamos até começarmos a conversar e nos encontrarmos mais vezes, quem sabe até algo mais.

“       – Olá
         - Olá
         - Está tudo bem?
         - Agora sim, porque você está aqui.
         - Bobo.                                                        ”